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Edição 272

Carta ao Leitor — Edição 272

A punição imposta ao humorista Leo Lins e as mais recentes declarações absurdas de Lula estão entre os destaques desta edição

No Brasil destes tempos estranhos, quando uma única semana parece concentrar praticamente todas as barbaridades do universo político e econômico, é preciso calma. A probabilidade de os próximos sete dias serem ainda mais assustadores é alta.

A semana ada terminou com outra pérola de Lula. “Deus deixou o sertão sem água porque sabia que eu ia ser presidente da República e ia trazer água pra cá”, declarou o presidente durante uma discurseira em Cachoeira dos Índios, na Paraíba. Como mostra o artigo de Augusto Nunes, não é a primeira vez que Lula — depois de se comparar, entre outros, a Nelson Mandela, Juscelino Kubitschek e Getúlio Vargas — se coloca acima ou ao lado de Deus. É improvável que seja a última.

A segunda-feira, 2 de junho, começou com o primeiro debate público entre os candidatos à presidência do PT. A maioria dos presentes no palco e na plateia defendeu uma guinada radical à esquerda no governo Lula, elogiou o socialismo, condenou o capitalismo, louvou ditaduras companheiras, como as existentes em Cuba e na Venezuela, além de exumar um punhado de delírios ideológicos. “Não existe um único interesse objetivo da população de carne e osso, da proteção contra o crime à redução de impostos, que o PT e a esquerda defendam”, observa J.R. Guzzo no artigo de capa desta edição. 

Hoje, o PT está moribundo e Lula encontra-se entubado na UTI, tratando de sua própria sobrevivência, afirma Guzzo. Quem tem fornecido todo o ar que respiram é o STF. Na terça-feira, o ministro da Justiça, Ricardo Lewandowski — até ontem ministro do Supremo —, mandou a Polícia Federal investigar o caso de uma mulher que gritou “Lula ladrão” nas imediações da casa do presidente. (Talvez porque a segurança pública no Brasil tenha a mesma qualidade da existente na Suíça, a PF age como se não houvesse nada mais urgente a investigar.)

Na mesma terça-feira, pela televisão, a população assistiu ao espetáculo inverossímil. Um funkeiro ligado ao crime organizado saiu da prisão depois de quatro dias na cela e foi ovacionado por uma multidão de iradores. Para Rodrigo Constantino, é mais um sinal de que “o grau de deterioração moral da sociedade brasileira não tem precedentes”. Na recepção a MC Poze, estava o rapper Oruam, filho de Marcinho VP, um dos chefões do Comando Vermelho. Oruam faz sucesso entre jovens com músicas que esculacham as mulheres, glamourizam o crime e idolatram bandidos.

No mesmo dia, o humorista Leo Lins foi condenado a oito anos de prisão em regime fechado, multa de R$ 1,4 milhão e indenização de R$ 303 mil — por fazer piadas. Se fizessem hoje o que faziam há pouco tempo, grandes humoristas brasileiros, como Chico Anysio e Jô Soares, muito provavelmente seriam condenados pela Justiça, lembra Eliziário Goulart Rocha. Segundo a lei brasileira, a pena máxima para quem faz piada com “grupos minoritários” é maior do que a aplicada a ladrões, receptadores de mercadorias roubadas e sequestradores. Para Tiago Pavinatto, essa sentença é “sintomática da juristocracia fundamentalista instaurada no Brasil para intimidar, silenciar e aniquilar opositores políticos”.

Na quarta-feira, 4, o STF retomou o julgamento sobre censura na internet com o voto do ministro André Mendonça — uma explanação que exigiu dois dias de leitura. Para Alexandre Garcia, o voto foi “uma aula magna sobre liberdade, ordem institucional e democracia”. Apesar disso, o Supremo insiste em fantasiar-se de Legislativo, mudar a lei e oficializar a ressurreição da censura. Até o momento, ninguém sabe a quem será atribuída a impossível tarefa de fiscalizar bilhões de postagens diárias nas redes sociais e determinar o que pode e o que não pode estar ali.

Alexandre Garcia recorda uma sequência de inversões eternizadas no livro 1984, de George Orwell: “Guerra é Paz; Liberdade é Escravidão; Ignorância é Força”, determina o Grande Irmão. Hoje, insiste-se em implantar no Brasil novas verdades: “Manifestação popular é golpe; crítica é ato antidemocrático; opinião contrária é fake news; contrapor-se a uma esquerdista é misoginia, a um esquerdista é fascismo. E censura é liberdade”. 

Mais uma semana está chegando. Já ou da hora de voltarmos à normalidade democrática.

Boa leitura.

Branca Nunes,

Diretora de Redação

Capa da Revista Oeste, edição 272 | Foto: Revista Oeste

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11 comentários
  1. Candido Andre Sampaio Toledo Cabral
    Candido Andre Sampaio Toledo Cabral

    Parabéns Branca Nunes. Como de costume.

  2. Luzia Helena Lacerda Nunes Da Silva
    Luzia Helena Lacerda Nunes Da Silva

    O PT nu, o Brasil de cabeça para baixo, os valores, as verdades e virtudes estraçalhados. É um tempo realmente estranho e assustador. Oeste é uma das âncoras que nos dá segurança. Você é a comandante. Coragem!

  3. Gelson Noé Manzoni de Oliveira
    Gelson Noé Manzoni de Oliveira

    Há mais de 500 anos este País sobrenada no mesmo pântano lamacento e não consegue sair. Sem dúvida, o diabo, se existe, é brasileiro.

  4. Gelson Noé Manzoni de Oliveira
    Gelson Noé Manzoni de Oliveira

    Branca Nunes resume, como sempre, todo o menu semanal, de maneira irrepreensível, esclarecedora e fulminante. Parabéns, Branca.

  5. Gelson Noé Manzoni de Oliveira
    Gelson Noé Manzoni de Oliveira

    Branca Nunes resume, como sempre, todo o menu semanal, de maneira irrepreensível, esclarecedora e fulminante. Parabéns, Branca.

  6. Marcio Cruz
    Marcio Cruz

    Lula critica o “genocidio” de Israel “matando civis e especialmente crianças em Gaza”….
    Lula critica as falas do Trump, com intenção de ocupar territórios da Groenlândia e Canadá… “.

    Mas vc nunca ouvirá o Lula criticar a Rússia por invadir territórios da Crimeia e Ucrânia, matando civis (especialmente crianças)

  7. Erasmo Silvestre da Silva
    Erasmo Silvestre da Silva

    Deus nem disse pra ele que não dinamitasse os canais da transposição

  8. Wagner Darlan Antas de Almeida
    Wagner Darlan Antas de Almeida

    Esse trio abre a nossa mente.Esclarece o fatos. É a verdade nua e crua. Sem filtros sem arrudeios.

  9. Célio Antônio Carvalho
    Célio Antônio Carvalho

    So uma correção: o Augusto Nunes é um tanto mais jovem que os outros dois. Mas é tanto tempo acompanhando-o que não faz mal nenhum!

  10. Célio Antônio Carvalho
    Célio Antônio Carvalho

    Muito bem meus caros. O Brasil, infelizmente, nunca achou uma saída boa para os seus habitantes, o seu povo, a sua gente.
    Aliás, nunca ou do país do futuro. Eu tenho dó sim; fico imaginando aqui esses grandes jornalistas Alexandre Garcia, Augusto Nunes e J. R. Guzzo que estão com seus oitenta e tantos anos, cansados, exautos de tantas falcatruas, desvios e roubalheiras e agora essas aberrações da justiça democrática brasileira.
    A gente chora sim. A gente se revolta sim. A gente desiste sim.
    Eu digo e repito sempre: daqui a umas seis gerações decerto seremos melhores, iguais, humanos e decentes.
    É muita perda de tempo.

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